sexta-feira, 3 de julho de 2015

O metalirismo de João Preda

       

 O metalirismo de João Preda
Qui, 04 de Outubro de 2012 18:16
ALLYSON DE SOUSA DO JORNAL 
TRIBUNA DE ANÁPOLIS 



Há todo um universo de sociologias por se fazer, ao que diz Gilberto Freyre. Há também uma galáxia à qual o crítico pode aplicar seu olho inquiridor, ou nem tão judicial assim, em tempos como os de culturalismo. Uma das estrelas dessa galáxia de temas é a literatura de ficção que se desenvolve, agora relativa aos vários gêneros literários, e que tem por substrato o espiritualismo. Se os romances foram consagrados pela obra monumental de um Chico Xavier, há uma nova contística e novas publicações de poemas com base no que se pode antever, sentir e supor do além-vida. Um dos resultados mais típicos dessa voga, que, se não é novidade, não é história velha a ser contada pelos espíritos evoluídos das esquinas das cidades etéreas, é Frequência do Amor, coletânea de contos e poesias de João Preda. Se esse corpo de doutrina tão pródigo em produção literária cultivou o romance como poucos credos, por que a contística e a arte poética demoraram mais para chegar às editoras, leigas e religiosas? Um bom critério para investigação é a leitura de Frequência do Amor. Poucos se dão conta do fato, mas o espiritismo, se enquadrado em uma perspectiva tributária da História das Ideias, é muito mais uma realização da Ilustração do século XVIII, ou, mais precisamente, um resultado do processo de difusão das idéias ilustradas do século XVIII na centúria seguinte. Isso quer dizer, entre outras coisas, que o espiritismo, como corpo doutrinal, é o mais racionalista dos ramos da fé cristã (se é que o espiritualismo pode ser chamado de fé). Afinal, foi o próprio Allan Kardec quem afirma que, no dia em que a ciência provar a falibilidade da doutrina espírita, os fiéis deveriam seguir a ciência e abandonar o espiritismo. Um bom procedimento para se analisar os contos, crônicas e poemas de Frequência do Amor é compará-lo, sob o ponto de vista do procedimento pessoal do autor e a temática, com a mais típica expressão
poética do pensamento ilustrado, qual seja, o arcadismo. Despojada de toda a formatação anacreôntica e dos detalhes mais sectários de sua poética inspirada na antiguidade clássica, a poesia árcade é um procedimento de iniciaçãoa um experimento tépido da vida. Não experimentar nada em demasia e procurar o equilíbrio e a sobriedade no que os antigos chamavam de imitação (no sentido de imitação da natureza) era seu móvel mais essencial. Os feitos literários sensíveis da literatura espiritualista curiosamente obedecem a um princípio semelhante de posicionamento e técnica de composição. O além-vida, a busca das explicações do presente e da vida material em vidas passadas são buscados no cotidiano. O fundamento do lirismo é a experiência da vida passada. Nesse lirismo, há uma mudança de voltagem. O indivíduo deixa de ser o centro das atenções. As "sinapses anímicas", as pontes que um ser constrói em direção ao outro
utilizando a matéria prima da vida passada, são os elementos que predominam. Resulta disso uma literatura pródiga em aprofundar lições para uma vida mais rica em experiências de solidariedade, tidas como o fundamento para o acesso ao outro e a si mesmo. Resulta daí um lirismo diferenciado, feito não de um mergulho no self, nem do acesso solitário do ente ao ser em uma de suas manifestações epocais, como afirmava Heiddegger, mas de uma construção sináptica, conformada pela vontade do acesso ao outro por meio da experiência extrassensorial da vida passada. O ser não é o indivíduo tem seu mais recente upload de carne e osso. É a confluência de um rosário de outras experiências. Na verdade, Frequência de Amor, na medida em que cultiva esses gêneros intimistas, traz à tona um surpreendente metalirismo. Só isso faz do livro uma Invitation Au Voyage como poucas.


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